O pavoroso circo das tragédias
O que direi é necessariamente polêmico e sei que a maioria não concordará comigo. No entanto, acho que este é o momento de uma certa tomada de posição acerca das tragédias que acontecem diariamente e que acabam na mídia.
É óbvio que jornal, televisão e rádios vivem do diário, do inesperado, do surpreendente em todos os aspectos que essa palavra possa adotar. E eu fico pensando: a morte de Isabella, de João Hélio e outros, de fato serviram para uma mudança de posição da sociedade?
Sinceramente? A resposta é NÃO! E minha percepção baseia-se no fato de que há poucos movimentos estruturados que consigam movimentar um grande número de pessoas para manifestarem-se publicamente, com uma intenção declarada contra a violência em geral e contra a infância em particular.
Para mim, não bastam aquele amontado de gente na frente do prédio dos Nardoni gritando justiça e fazendo bagunça. Para mim, aquilo não é algo organizado e que queira produzir mudanças e demonstrar indignação, é apenas BAGUNÇA.
Daí aparece na Globo uma reportagem com o cara vendendo amendoim, distribuindo santinhos com o nome da gráfica e todos ficam indignados e coisa e tal. Será que mesmo essa indignação é legítima?
Fico perguntando qual é o limite entre a informação e um “teatro” da vida real? Ninguém nega ou negaria a divulgação da notícia, o acompanhamento do caso, enfim, a reportagem. O que acho extremamente complicado é o acompanhamento de cada “suspiro” do delegado responsável, de divulgarem-se relatórios parciais da perícia e etc e tal.
Para onde vai a presunção de inocência? Para o espaço. Todos são culpados até prova em contrário e é por esse ralo que pode escoar a reputação, a vida e o futuro das pessoas. Será necessário evocar novamente o caso da Escola de Base?
No fim da história, ontem, durante a transferência do casal Nardoni, a portaria do prédio estava mais para portaria de hotel quando um artista famoso está hospedado, do que um protesto bem planejado com objetivo de transformar.
O promotor Cembranelli diz que espera que a Isabella não seja esquecida. Desculpe, Doutor mas isso não é possível. Infelizmente, João Hélio, Isabella Nardoni, Ives Ota, serão esquecidos pela maioria da população à partir da próxima tragédia que de certo assolará nosso país.
Os processos correrão lentamente nas Varas Criminais, lentamente irão para o juri, no meio de chicanas jurídicas enormes e só voltarão ao notíciário quando ambos forem ao banco dos réus e quando forem. Até lá outras Isabellas, Ives, João Hélios terão sido abatidos no altar da estupidez e insensatez dos ditos “seres humanos”.
Estou cansado de prantear mortos, especialmente jovens e crianças e é de se imaginar quantos casos acontecem diariamente sem que ao menos saibamos. E querem saber mais? Tudo fruto de uma sociedade permissiva , egoísta, sem valores e nem limites, onde nem a indignação da maioria é santa. Que mundo horroroso que tenho para viver.
Para mim e para tantos amigos que prezam a vida humana, que não suportam mais ver a tragédia travestida de circo, de fato, o caso Isabella apenas começa aqui. Para tantos, aguarda-se o próximo capítulo, o próximo cadáver, um desejo patológico de cultivar a desgraça e a morte. Escatologia de um mundo doente. Que pena!
É isso aí!
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